Queridos anjinhos, aqui está o TEXTO 2
Vamos debater a realidade rural e urbana do Brasil nas próximas aulas desa semana. Por este motivo, postei aquie os dois textos que vocês deverão ler antes da discussão. Lembrando que os textos trazem idéias antagonicas, e que as equipes sóserao definidas na aula, por sorteio. Preparem o argumento! Sugiro que leiam os textos e marquem as idéias centrais de cada autor. Isso ajuda a formular os argumentos de vocês na hora da discussão! Eis um dos textos:
A ILUSÃO DO BRASIL URBANO
Você já teve a curiosidade de procurar saber quantos municípios brasileiros têm livraria ? Se sim, você é parte do seleto grupo dos que sabem que eles não chegam a 11%. Só em cerca de 600 dos 5.562 municípios brasileiros existe livraria. Segunda pergunta, um pouco mais difícil: a sede de um desses municípios onde nem há livraria pode ser uma cidade ? A resposta seria forçosamente negativa se fossem de caráter funcional os critérios de elevação de uma vila à categoria de cidade. Povoações que não chegam a ter livraria também não costumam cumprir as funções públicas e privadas exigidas para que uma aglomeração seja cidade. Por exemplo, não costumam ter sistema de transporte coletivo ou hotel. Todavia, o Brasil dispensa qualquer exigência desse tipo. Toda sede de município é cidade e toda sede de distrito é vila. Um critério oficial tão absurdo que chega ao ridículo de considerar como cidade a sede do município gaúcho União da Serra, que só tem 4 casas com 18 habitantes. O município tem 1.900 habitantes, dos quais 286 são considerados urbanos por residirem nessa minúscula sede municipal, ou nas sedes de seus dois distritos.
Para dizer se parte de um município como União da Serra pode ser considerada urbana, qualquer pessoa de bom senso usaria critérios funcionais. Indagaria sobre a base das atividades econômicas dos moradores, e sobre a existência de esgoto ou de agência bancária. E certamente recusaria o critério administrativo em vigor, segundo o qual urbano é todo habitante que reside no interior dos perímetros delineados pelas Câmaras Municipais em torno das sedes de município ou de distrito. Infelizmente, é assim que o Brasil conta a sua população urbana desde o auge do Estado Novo, quando Getúlio Vargas baixou o decreto-lei 311/38. Até tribos indígenas foram consideradas urbanas pelos censos demográficos e demais pesquisas do IBGE realizadas nos últimos 64 anos. União da Serra (RS) é apenas o exemplo extremo daquilo que pode ser encontrado em pelo menos 4.500 municípios nos quais vivem 52 milhões de habitantes. Por exemplo: a) os rendimentos dos moradores resultam do uso de recursos naturais, b) o contingente dos rebanhos é muito superior aos representantes da espécie humana, c) o saneamento básico não chegou sequer a suas sedes, d) não dispõem de agência bancária.
Por mais esdrúxulo que seja chamar de cidades esses milhares de minúsculas sedes municipais, nada de muito grave ocorreria se o cálculo do “grau de urbanização” do País evitasse que tais populações fossem classificadas de forma idêntica aos habitantes das 27 capitais, das 12 aglomerações metropolitanas, das 37 aglomerações não-metropolitanas, dos 77 centros urbanos, ou até das 500 sedes de municípios ambivalentes. Mas não. Quando se diz que o grau de urbanização do Brasil chegou a 81,2% em 2000, é porque foram consideradas urbanas não somente as populações de todas essas minúsculas sedes de município, como também as populações das ainda menores sedes de distritos (vilas). Tudo o que no resto do mundo seria considerado como vilarejo, povoado, aldeia, etc. – isto é, as formas rurais do território - no Brasil é oficialmente classificado de urbano. E como fica cada vez mais lógico e racional que agricultores, pecuaristas, extrativistas, pescadores, e até povos indígenas prefiram residir nas simplórias sedes de seus municípios ou distritos, são imensos os contingentes das populações rurais que incham essa cômica ficção de que o Brasil seria 81,2% urbano.
Em Portugal, por exemplo, uma povoação só pode ser elevada à categoria de vila se possuir pelo menos metade de oito equipamentos coletivos: a) posto de assistência médica, b) farmácia, c) centro cultural, d) transportes públicos coletivos, e) estação dos correios e telégrafos, f) estabelecimentos comerciais e de hotelaria, g) estabelecimento que ministre escolaridade obrigatória, h) agência bancária. E uma vila só pode ser elevada à categoria de cidade se possuir, pelo menos, metade de dez equipamentos coletivos: a) instalações hospitalares com serviço de permanência b) farmácias, c) corporação de bombeiros, d) casa de espetáculos e centro cultural, e) museu e biblioteca, f) instalações de hotelaria, g) estabelecimento de ensino preparatório e secundário, h) estabelecimento de ensino pré-primário e infantários, i) transportes públicos, urbanos e suburbanos, j) parques ou jardins públicos.
Além desses critérios funcionais, há uma preliminar eliminatória: para que seja vila a povoação deve contar com mais de 3 mil eleitores em aglomerado populacional contínuo. E para ser elevada à categoria de cidade a exigência mínima é de 8 mil eleitores. São poucos os municípios brasileiros nos quais se pode encontrar 8 mil eleitores em aglomerado populacional contínuo. E mais raros ainda são os aglomerados populacionais que possuem alguns dos dez equipamentos coletivos que definem as cidades portuguesas. Mas é o total dos habitantes das 5.562 sedes de município e das 9.946 sedes de distrito que forma a população urbana oficial. Em direção oposta às melhores análises territoriais disponíveis, segundo as quais apenas 455 municípios fazem parte da rede urbana (378 em aglomerações e 77 centros urbanos de regiões rurais).
Também é inteiramente distorcida a visão que predomina no País sobre a relação entre o território rural e os três grandes setores da economia. O território rural não é - e nunca foi – base de atividades exclusivamente primárias. As atividades agrícolas ou minerais, por exemplo, jamais estiveram distantes de muitas atividades comerciais e de transporte. E o crescimento econômico moderno as vincula umbilicalmente a certas atividades industriais e a inúmeros outros tipos de serviços. Daí porque também é falso o estereótipo dominante segundo o qual “rural = agropecuário”. Isso nunca teve, não tem, nem nunca terá nada que ver com a realidade dos fatos. Mas é outra forte distorção diariamente reproduzida pelos meios de comunicação e pelo sistema educacional.
São gravíssimos os impactos desse duplo equívoco sobre as políticas governamentais. A começar pela irracional e injusta repartição dos recursos fiscais. As capitais ficam com um terço da receita final, apesar de só abrigarem pouco mais de um quinto dos habitantes. E quem mais arca com o prejuízo é o terço da população brasileira que reside em municípios rurais. Pior: como o IPTU é na prática o único tributo significativo à disposição das prefeituras, não resta sequer a possibilidade de que 80% dos municípios cheguem a ter razoável arrecadação própria, ao contrário do que ocorre com uns 500 municípios inequivocamente urbanos e parte dos 500 ambivalentes. Além disso, quais seriam as chances de se conseguir um programa de melhoria da educação rural, ou mesmo da habitação rural, num ambiente em que se acredita que só um décimo da população será rural em 2010?
Enfim, é absolutamente compreensível que poucos saibam que um terço da população brasileira é rural e que essa proporção poderá não diminuir nas próximas décadas, pois todos somos vítimas da ficção demográfica oficial. Mas ninguém tem o direito de desconhecer as imensas desigualdades que hoje existem entre o Brasil urbano e o Brasil rural.
Uma análise da configuração territorial do Brasil revela uma tendência que não deveria ser ignorada pelos formuladores das políticas governamentais. Mesmo que se acrescente ao Brasil urbano todos os municípios ambivalentes, considerando-os como vilas de tipo “rurbano” que poderão se transformar em centros urbanos, chega-se a um total de 1.022 municípios, nos quais residiam em 2000 quase 118 milhões de pessoas. Nesse subconjunto ampliado, o aumento populacional entre 1991 e 2000 foi próximo de 20%, com destaque para as aglomerações não-metropolitanas e para os centros urbanos. Em ambos houve crescimento demográfico um pouco superior.
Mas não se deve deduzir daí, como se faz com extrema freqüência, que todos os outros municípios - de pequeno porte e características rurais - tenham sofrido evasão populacional. Isto ocorreu na metade desses municípios. Mas em um quarto deles houve um aumento populacional de 31,3%, bem superior, portanto, aos que ocorreram no Brasil urbano. E mais do que o dobro do crescimento populacional do Brasil como um todo, que foi de 15,5% no período intercensitário de 1991-2000.
Praticamente nada se sabe sobre os fatores que levaram esses 1.109 municípios com características rurais a terem um crescimento populacional tão significativo. Há casos que se explicam pelo dinamismo econômico de micro e pequenas empresas do setor de serviços, principalmente nas regiões Sul e Sudeste. Há casos que se explicam pelo dinamismo político de Prefeituras, particularmente no Nordeste. Mas se está muito longe de uma interpretação satisfatória sobre esse fenômeno, espalhado por todo o território nacional.
Mesmo assim, o que já se sabe é suficiente para que se rompa com a visão de que todo o Brasil rural é formado por municípios que estão se esvaziando. Não é admissível que se considere mais de 90% do território brasileiro, 80% de seus municípios, e 30% de sua população como mero resíduo deixado pela epopéia urbano-industrial da segunda metade do século 20. Pior, não é possível tratá-lo como se nele existissem entre 4.500 e 5.000 cidades imaginárias.
Todavia, o que mais interessa não é comparar a participação demográfica dos espaços mais urbanos, mais rurais, ou intermediários. O que importa é entender que o futuro dessas populações dependerá cada vez mais de articulações intermunicipais capazes de diagnosticar as vocações do território que compartilham, formular um plano de desenvolvimento microrregional, e viabilizar seu financiamento com o imprescindível apoio das esferas governamentais superiores. Isso vale tanto para as aglomerações, quanto para as microrregiões. Mas é óbvio que são as microrregiões que não contêm aglomerações as que menos estarão preparadas para enfrentar esse desafio. Daí a importância de um plano federal especialmente voltado para a promoção de articulações intermunicipais microrregionais de pequeno porte populacional. Isto é, um programa especialmente voltado ao desenvolvimento sustentável do Brasil rural.
É absolutamente necessária alguma forma de articulação microrregional dos municípios rurais, que inclua seu eventual centro urbano e seus municípios intermediários, para que possa haver diagnóstico, planejamento, divisão do trabalho e capacidade operacional. Infelizmente, muitas políticas do governo federal fazem com que os municípios só “se voltem para o próprio umbigo”, mediante criação de inúmeros conselhos municipais, em detrimento das articulações intermunicipais. Claro, é muito importante que a descentralização incentive a fiscalização da sociedade sobre o uso que as prefeituras fazem das verbas federais que recebem. Mas é equivocado imaginar que um conselho de um minúsculo município possa diagnosticar e planejar o desenvolvimento rural.
O rural é necessariamente territorial, e não setorial como os programas dos órgãos governamentais. O grande desafio está, portanto, em propor uma estratégia realista que possa viabilizar uma factível transição de ações setoriais para uma articulação horizontal das intervenções.
Vamos debater a realidade rural e urbana do Brasil nas próximas aulas desa semana. Por este motivo, postei aquie os dois textos que vocês deverão ler antes da discussão. Lembrando que os textos trazem idéias antagonicas, e que as equipes sóserao definidas na aula, por sorteio. Preparem o argumento! Sugiro que leiam os textos e marquem as idéias centrais de cada autor. Isso ajuda a formular os argumentos de vocês na hora da discussão! Eis um dos textos:
A ILUSÃO DO BRASIL URBANO
José Eli da Veiga
Você já teve a curiosidade de procurar saber quantos municípios brasileiros têm livraria ? Se sim, você é parte do seleto grupo dos que sabem que eles não chegam a 11%. Só em cerca de 600 dos 5.562 municípios brasileiros existe livraria. Segunda pergunta, um pouco mais difícil: a sede de um desses municípios onde nem há livraria pode ser uma cidade ? A resposta seria forçosamente negativa se fossem de caráter funcional os critérios de elevação de uma vila à categoria de cidade. Povoações que não chegam a ter livraria também não costumam cumprir as funções públicas e privadas exigidas para que uma aglomeração seja cidade. Por exemplo, não costumam ter sistema de transporte coletivo ou hotel. Todavia, o Brasil dispensa qualquer exigência desse tipo. Toda sede de município é cidade e toda sede de distrito é vila. Um critério oficial tão absurdo que chega ao ridículo de considerar como cidade a sede do município gaúcho União da Serra, que só tem 4 casas com 18 habitantes. O município tem 1.900 habitantes, dos quais 286 são considerados urbanos por residirem nessa minúscula sede municipal, ou nas sedes de seus dois distritos.
Para dizer se parte de um município como União da Serra pode ser considerada urbana, qualquer pessoa de bom senso usaria critérios funcionais. Indagaria sobre a base das atividades econômicas dos moradores, e sobre a existência de esgoto ou de agência bancária. E certamente recusaria o critério administrativo em vigor, segundo o qual urbano é todo habitante que reside no interior dos perímetros delineados pelas Câmaras Municipais em torno das sedes de município ou de distrito. Infelizmente, é assim que o Brasil conta a sua população urbana desde o auge do Estado Novo, quando Getúlio Vargas baixou o decreto-lei 311/38. Até tribos indígenas foram consideradas urbanas pelos censos demográficos e demais pesquisas do IBGE realizadas nos últimos 64 anos. União da Serra (RS) é apenas o exemplo extremo daquilo que pode ser encontrado em pelo menos 4.500 municípios nos quais vivem 52 milhões de habitantes. Por exemplo: a) os rendimentos dos moradores resultam do uso de recursos naturais, b) o contingente dos rebanhos é muito superior aos representantes da espécie humana, c) o saneamento básico não chegou sequer a suas sedes, d) não dispõem de agência bancária.
Por mais esdrúxulo que seja chamar de cidades esses milhares de minúsculas sedes municipais, nada de muito grave ocorreria se o cálculo do “grau de urbanização” do País evitasse que tais populações fossem classificadas de forma idêntica aos habitantes das 27 capitais, das 12 aglomerações metropolitanas, das 37 aglomerações não-metropolitanas, dos 77 centros urbanos, ou até das 500 sedes de municípios ambivalentes. Mas não. Quando se diz que o grau de urbanização do Brasil chegou a 81,2% em 2000, é porque foram consideradas urbanas não somente as populações de todas essas minúsculas sedes de município, como também as populações das ainda menores sedes de distritos (vilas). Tudo o que no resto do mundo seria considerado como vilarejo, povoado, aldeia, etc. – isto é, as formas rurais do território - no Brasil é oficialmente classificado de urbano. E como fica cada vez mais lógico e racional que agricultores, pecuaristas, extrativistas, pescadores, e até povos indígenas prefiram residir nas simplórias sedes de seus municípios ou distritos, são imensos os contingentes das populações rurais que incham essa cômica ficção de que o Brasil seria 81,2% urbano.
Em Portugal, por exemplo, uma povoação só pode ser elevada à categoria de vila se possuir pelo menos metade de oito equipamentos coletivos: a) posto de assistência médica, b) farmácia, c) centro cultural, d) transportes públicos coletivos, e) estação dos correios e telégrafos, f) estabelecimentos comerciais e de hotelaria, g) estabelecimento que ministre escolaridade obrigatória, h) agência bancária. E uma vila só pode ser elevada à categoria de cidade se possuir, pelo menos, metade de dez equipamentos coletivos: a) instalações hospitalares com serviço de permanência b) farmácias, c) corporação de bombeiros, d) casa de espetáculos e centro cultural, e) museu e biblioteca, f) instalações de hotelaria, g) estabelecimento de ensino preparatório e secundário, h) estabelecimento de ensino pré-primário e infantários, i) transportes públicos, urbanos e suburbanos, j) parques ou jardins públicos.
Além desses critérios funcionais, há uma preliminar eliminatória: para que seja vila a povoação deve contar com mais de 3 mil eleitores em aglomerado populacional contínuo. E para ser elevada à categoria de cidade a exigência mínima é de 8 mil eleitores. São poucos os municípios brasileiros nos quais se pode encontrar 8 mil eleitores em aglomerado populacional contínuo. E mais raros ainda são os aglomerados populacionais que possuem alguns dos dez equipamentos coletivos que definem as cidades portuguesas. Mas é o total dos habitantes das 5.562 sedes de município e das 9.946 sedes de distrito que forma a população urbana oficial. Em direção oposta às melhores análises territoriais disponíveis, segundo as quais apenas 455 municípios fazem parte da rede urbana (378 em aglomerações e 77 centros urbanos de regiões rurais).
Também é inteiramente distorcida a visão que predomina no País sobre a relação entre o território rural e os três grandes setores da economia. O território rural não é - e nunca foi – base de atividades exclusivamente primárias. As atividades agrícolas ou minerais, por exemplo, jamais estiveram distantes de muitas atividades comerciais e de transporte. E o crescimento econômico moderno as vincula umbilicalmente a certas atividades industriais e a inúmeros outros tipos de serviços. Daí porque também é falso o estereótipo dominante segundo o qual “rural = agropecuário”. Isso nunca teve, não tem, nem nunca terá nada que ver com a realidade dos fatos. Mas é outra forte distorção diariamente reproduzida pelos meios de comunicação e pelo sistema educacional.
São gravíssimos os impactos desse duplo equívoco sobre as políticas governamentais. A começar pela irracional e injusta repartição dos recursos fiscais. As capitais ficam com um terço da receita final, apesar de só abrigarem pouco mais de um quinto dos habitantes. E quem mais arca com o prejuízo é o terço da população brasileira que reside em municípios rurais. Pior: como o IPTU é na prática o único tributo significativo à disposição das prefeituras, não resta sequer a possibilidade de que 80% dos municípios cheguem a ter razoável arrecadação própria, ao contrário do que ocorre com uns 500 municípios inequivocamente urbanos e parte dos 500 ambivalentes. Além disso, quais seriam as chances de se conseguir um programa de melhoria da educação rural, ou mesmo da habitação rural, num ambiente em que se acredita que só um décimo da população será rural em 2010?
Enfim, é absolutamente compreensível que poucos saibam que um terço da população brasileira é rural e que essa proporção poderá não diminuir nas próximas décadas, pois todos somos vítimas da ficção demográfica oficial. Mas ninguém tem o direito de desconhecer as imensas desigualdades que hoje existem entre o Brasil urbano e o Brasil rural.
Uma análise da configuração territorial do Brasil revela uma tendência que não deveria ser ignorada pelos formuladores das políticas governamentais. Mesmo que se acrescente ao Brasil urbano todos os municípios ambivalentes, considerando-os como vilas de tipo “rurbano” que poderão se transformar em centros urbanos, chega-se a um total de 1.022 municípios, nos quais residiam em 2000 quase 118 milhões de pessoas. Nesse subconjunto ampliado, o aumento populacional entre 1991 e 2000 foi próximo de 20%, com destaque para as aglomerações não-metropolitanas e para os centros urbanos. Em ambos houve crescimento demográfico um pouco superior.
Mas não se deve deduzir daí, como se faz com extrema freqüência, que todos os outros municípios - de pequeno porte e características rurais - tenham sofrido evasão populacional. Isto ocorreu na metade desses municípios. Mas em um quarto deles houve um aumento populacional de 31,3%, bem superior, portanto, aos que ocorreram no Brasil urbano. E mais do que o dobro do crescimento populacional do Brasil como um todo, que foi de 15,5% no período intercensitário de 1991-2000.
Praticamente nada se sabe sobre os fatores que levaram esses 1.109 municípios com características rurais a terem um crescimento populacional tão significativo. Há casos que se explicam pelo dinamismo econômico de micro e pequenas empresas do setor de serviços, principalmente nas regiões Sul e Sudeste. Há casos que se explicam pelo dinamismo político de Prefeituras, particularmente no Nordeste. Mas se está muito longe de uma interpretação satisfatória sobre esse fenômeno, espalhado por todo o território nacional.
Mesmo assim, o que já se sabe é suficiente para que se rompa com a visão de que todo o Brasil rural é formado por municípios que estão se esvaziando. Não é admissível que se considere mais de 90% do território brasileiro, 80% de seus municípios, e 30% de sua população como mero resíduo deixado pela epopéia urbano-industrial da segunda metade do século 20. Pior, não é possível tratá-lo como se nele existissem entre 4.500 e 5.000 cidades imaginárias.
Todavia, o que mais interessa não é comparar a participação demográfica dos espaços mais urbanos, mais rurais, ou intermediários. O que importa é entender que o futuro dessas populações dependerá cada vez mais de articulações intermunicipais capazes de diagnosticar as vocações do território que compartilham, formular um plano de desenvolvimento microrregional, e viabilizar seu financiamento com o imprescindível apoio das esferas governamentais superiores. Isso vale tanto para as aglomerações, quanto para as microrregiões. Mas é óbvio que são as microrregiões que não contêm aglomerações as que menos estarão preparadas para enfrentar esse desafio. Daí a importância de um plano federal especialmente voltado para a promoção de articulações intermunicipais microrregionais de pequeno porte populacional. Isto é, um programa especialmente voltado ao desenvolvimento sustentável do Brasil rural.
É absolutamente necessária alguma forma de articulação microrregional dos municípios rurais, que inclua seu eventual centro urbano e seus municípios intermediários, para que possa haver diagnóstico, planejamento, divisão do trabalho e capacidade operacional. Infelizmente, muitas políticas do governo federal fazem com que os municípios só “se voltem para o próprio umbigo”, mediante criação de inúmeros conselhos municipais, em detrimento das articulações intermunicipais. Claro, é muito importante que a descentralização incentive a fiscalização da sociedade sobre o uso que as prefeituras fazem das verbas federais que recebem. Mas é equivocado imaginar que um conselho de um minúsculo município possa diagnosticar e planejar o desenvolvimento rural.
O rural é necessariamente territorial, e não setorial como os programas dos órgãos governamentais. O grande desafio está, portanto, em propor uma estratégia realista que possa viabilizar uma factível transição de ações setoriais para uma articulação horizontal das intervenções.
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